Auto biografia artística virtual. Registros de eventos, resenhas, desenhos, crônicas, contos, poesia marginal e histórias vividas. Tudo autoral. Quando não, os créditos serão dados.

Qualquer semelhança com a realidade é verdade mesmo.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Não Só Pra Desinfetar

Quando narro as minhas experiências do passado com o álcool, até mesmo os mais assíduos beberrões chegam a se impressionar.  Não que eu tenha os casos como algo glorioso.  Porém, hoje eu mesmo chego a dar risadas em análise às lembranças.  Os excessos são justificados facilmente com a influência punk e os ímpetos auto destrutivos da adolescência.  Alguns desses momentos memoráveis descrevo agora.
Comecei com a velha “loura gelada” cerveja por incentivo dos próprios tios nas reuniões familiares que aconteciam sempre às sextas.  Era muita cerveja que regava as partidas de dominó.  Não demorou pra que aquilo se tornasse um líquido de ouro pra mim.
Com o aumento do convívio no underground do rock, comecei a apreciar a cachaça e outras bebidas tão fortes e baratas quanto.  A apreciação era tanta e o consumo exponencial que a água já não me era mais ardente.  Com refrigerante, com guaraná, com ki-suqui, com yogurte, pura, com suco ou com apenas algum pedaço de fruta, a cachaça entrava que era uma beleza.  Como o principal era a quantidade e não a qualidade, o óbvio era pela marca mais barata encontrada.  O consumo era tanto que as vezes faltava dinheiro pra comprar mais.  Quando isto acontecia, eu aprendi a recorrer para uma alternativa bizarra.  Álcool de farmácia.  A preferência era pela marca de nome “Tubarão”, por ser barata.  Dois dedos de álcool no copo e o restante era completado com guaraná.  Cheguei a tomar Tubarão com vários amigos.  Para alguns, só revelei tratar-se de álcool de farmácia após o primeiro copo ingerido.  Num dos momentos de mais fissuras, cheguei a vender um disco de Jimi Hendrix para comprar cachaça.  Tinha esse feito, como o maior arrependimento de minha vida.  Só não o é mais, devido a não beber mais de quinze anos e já ter conseguido comprar o disco novamente.
Numa certa data que não lembrarei nunca, minha irmã mais velha que é lésbica, sociopata e que toma remédio controlado (pura verdade), trabalhava em um bar qualquer.  A sociedade dela se desfez e ela apareceu em casa com uma caixa de cachaça lacrada.  Fez a proposta pra mim: caso eu a vende-se, cinquenta por cento do lucro era meu.  Lógico que topei.  Meus pais e minhas irmãs passavam o fim de semana todo na Vivenda Verde (condomínio campestre de Manaus).  Sozinho em casa eu olhava pra caixa de garrafas e a caixa de garrafas olhava pra mim.  O flerte não demorou muito e partimos logo para o amor.  A caixa não durou um mês e certamente que não dei um centavo para minha irmã maldita.
Bebia tanta cachaça que a cerveja já não me fazia efeito.  Quando algum conhecido dizia ter pego um porre com cerveja, eu ria e dizia que cerveja era bebida de criança.
Cheguei ao cúmulo de sair na madrugada em baixo de chuva atrás de cachaça pra venda, devido a ter acabado meu estoque pessoal.  Nessas peregrinações, passei pelo meio de galeras armadas, palafitas apodrecidas por cima de igarapés poluídos e por batidas policiais austeras.
Amanhecer fora de casa em bairros distantes era normal.  Numa dessas acordei com uma ressaca triste e com uma dor de cabeça horrível.  Depois de alguns minutos recobrando a consciência, percebi que estava numa cama estranha, num quarto estranho.  Olhei ao redor com calma, mas não reconheci nada.  Tudo era estranho.  Os posters amarelados de bandas de rock nas paredes de madeira, os lençóis amarrotados, o piso sujo de vômito e baganas de cigarro e o teto de zinco remendado.  Onde eu estava?  Não sabia.  Sentei na cama e não tive coragem de olhar pela janela aberta, porque a luz do sol estava forte e isso incomoda qualquer bêbado ao acordar.  Percebi que havia um som de fundo.  Rock and roll tocando em outro cômodo com várias gargalhadas e vozes em diálogo.  Antes de tomar qualquer atitude, a porta se abriu e um maluco cabeludo colocou a cabeça pra dentro dizendo:
- Ei, brother!  O rango tá pronto.  Chega aí!
Quando criei coragem e saí do quarto, vi uma espécie de sala de jantar bukowskiana onde cerca de uma dúzia de rockeiros, incluindo uma garota que conhecia do centro da cidade, estavam compartilhando um almoço com a gana de uma família de hienas.  Antes de eu chegar a mesa, me colocam nas mãos um copo de cachaça.  Pensei imediatamente:
- Lar, doce lar.
Um tempo atrás a vodka Katiuscha teve alguns lotes apreendidos por estarem adulteradas com ethanol.  Por azar do destino cheguei a beber uma dessas garrafas.  No dia seguinte meu vômito saia verde de dentro de mim a cada meia hora.  A sensação era tão ruim que pensei seriamente em morte.
Numa outra situação eu estava na companhia de meu amigo Augusto Wallace (vulgo Sibi) e um outro conhecido como Pépe.  A madrugada já estava alta, não havia mais bares abertos, não tínhamos mais dinheiro, a bebida tinha acabado, mas a vontade de beber não.  Não havia mais o que fazer.  Estávamos praticamente conformados escutando um velho aparelho com fitas k7 na garagem da casa do pai de Pépe.  Quando eu olhei para o fusquinha, tive a macabra idéia.  Pépe topou, então não tivemos dúvidas.  Com uma mangueira velha e uma garrafa vazia, tiramos um pouco de gasolina do tanque daquele meio de transporte que alguns chamam de carro.  Foi nossa salvação.  O primeiro gole queimava tanto que deixava-nos sem respirar por um tempo, mas depois que acostumamos, a gasolina descia maravilhosamente pela garganta.
Provavelmente que há outras experiências marcantes.  Caso as lembre, postarei na devida oportunidade.

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