Dentre todos os livros escritos sobre
os Ramones, “Eu Dormi com Joey Ramone” é o que mais se aproxima da histórica
irmandade, sem perder fidelidade. O motivo é o mais justificável possível, foi
escrito por Mickey Leigh, ninguém
menos que o irmão sanguíneo de Jeffry
Ross Hyman, vocalista mundialmente conhecido como Joey Ramone. Logicamente que o foco está diretamente em Joey, com
os outros Ramones, a história da
banda, os sucessos e insucessos e tudo mais do universo ramoníaco girando em torno da narrativa, mas isso é de extrema
importância para a compreensão da personalidade, da filosofia e até da abatida
fisionomia do Ramone mais carismático e mais querido pelos fãs.
Um outro diferencial deste livro, está
na ótima escrita. Leigh já atuava como jornalista e cronista quando se deu o
trabalho de começar a labuta do registro. Então percebe-se na leitura, um
discorrer profissional, quase lírico, que não perde sua simplicidade. Prova
disso, está na humildade de Mickey em convidar Legs McNeil (co autor do
divertido e clássico “Mate-me Por Favor”)
para dividir esta autoria.
Capa do livro muito bem escrito pelo irmão de Joey |
Logo na apresentação da infância dos
irmãos, vem a tona a problemática de Joey com sua estranha anatomia que viria
lhe render bullying na escola, nas
ruas, na vizinhança, na adolescência, até a consagração de sua fama. Este
certamente foi o fator predominante para o desencadeamento na vida de baixo
estima, depressão, abuso de drogas, rejeição amorosa, surtos psicóticos, doença
sobre doença e prevalecimento do câncer. Apesar de todos os pontos negativos e
que levariam qualquer um a uma vida totalmente errante e sem nenhum tipo de
legado digno, desde cedo, também havia o acesso à música e à arte. A mãe, Charlotte Lesher (a quem o livro é dedicado), era curadora de sua própria galeria de
arte. O pai, Noel Hyman, sempre foi
apreciador de música, e proporcionou aos filhos os primeiros contatos com
rádios, vitrolas e instrumentos que levaram os garotos ao incentivo necessário.
Futuramente o pai chegaria a gravar uma canção natalina com ambos, mas esta
nunca chegou a ser lançada por ser considerada um verdadeiro “mico” familiar. Ao
sair da adolescência, vem a amizade com os outros rapazes que viriam a montar
os primeiros projetos de banda. Após consagrada a formação inicial dos Ramones, a cooperativa com os
conhecidos era óbvia, visto a falta de recursos para financiamentos e
remunerações. Com isso, Leigh participou gratuitamente da gravação vocal do
hino “Blitzkrieg Bop”. Isto nunca
veio a ser reconhecido por Johnny e chegou a ser motivo de processo judicial e
um dos fortes pontos de desavenças entre os irmãos Mickey e Joey. Ainda na
carência cooperativa, Mickey que já tinha a amizade de Johnny, naturalmente
entra para a equipe técnica da banda, trabalha e viaja por anos com o grupo,
ajudando nos bastidores, dando idéias nos moldes que caracterizariam o todo e
até ajudando Joey em várias de suas composições. Johnny que queria Mickey como
um eterno servidor dos Ramones, fazia
de tudo pra sabotar qualquer ascensão de Leigh como músico e chegou a pedir que
ele esquecesse a demissão declarada. Mesmo após consegui sair da equipe
técnica, o drama de ser irmão de Joey
Ramone ainda iria acompanhar Mickey por anos e anos lhe trazendo todo tipo
de infortúnio indesejado. A descoberta do câncer linfático de Joey foi o início
de um suspense que viria a ser tornar um verdadeiro terror com o seu
agravamento. As passagens onde as internações são detalhadas, chegam a dar o
sentimento de pena pelo sofrimento injusto que o querido enfermo amargou. Os
últimos momentos de vida, que fulminaram na morte, chega a ser tão emocionante
que provoca lágrimas nos leitores mais sensíveis. Incrível também como uma
pessoa tão querida, não teve o carinho de quase ninguém, salvo pelos familiares
mais próximos e de uns poucos amigos justamente citados. Vale ressaltar que
Mickey fez questão de que este livro fosse publicado no Brasil, devido ao leal carinho
dos fãs a Joey.
Mais do que um livro biográfico, “Eu Dormi com Joey Ramone” é de uma
fidelidade extraordinariamente detalhada, só como alguém da família e realmente
próximo a este ícone pode descrever. Mickey
Leigh foi feliz nesta labuta e se hoje goza dos direitos deixados pelo
famoso Ramone, é mais do que justo, por todo apoio, amizade e amor que um irmão
pode oferecer em sua vida. Tradução de Hilton
Lima; Editora Dublinense, Porto
Alegre; 2013; 360 páginas.
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