Auto biografia artística virtual. Registros de eventos, resenhas, desenhos, crônicas, contos, poesia marginal e histórias vividas. Tudo autoral. Quando não, os créditos serão dados.

Qualquer semelhança com a realidade é verdade mesmo.

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Entrevista Com Jorge Bandeira

Renomado artista amazonense, Jorge Bandeira conseguiu algo inédito: tornar-se referência para todas as classes artísticas da cidade de Manaus.  Seu nome é citado desde os artistas boêmios independentes até os imortais da Academia Amazonense de Letras.  Praticamente um multi mídia, já concretizou vários estilos de arte e com sua índole mútua com a natureza, demonstra ainda ter muito que criar pela frente.  Gentilmente cedeu esta entrevista para o blog Orestes.

Orestes: Desde quando você começou a produzir arte?
 Jorge Bandeira: Minha primeira manifestação artística foi desenhar um personagem feito na época da ditadura, o Sugismundo, um garotinho que aparecia na televisão.  Claro que era uma propaganda subliminar para o Brasil do "Ame-o ou Deixe-o".   Posso dizer, então, que já fui um agente da ditadura, isso quando tinha 5 anos, em 1973.  Depois, mais desenhos, porém cansei do Sugismundo e desenhava muito o Homem-Aranha, de tudo quanto é jeito e posição.  Até hoje não consigo desenhar o Aranha corretamente, sempre falta um detalhe...acho que vou voltar a desenhar o Sugismundo.
O: Qual o trabalho que você considera sua obra prima?
 J.B: Posso dizer que tenho dois trabalhos que considero significativos em minha produção: o que fiz para o evento "Corações Sem Taxímetro" no ICHL, no começo dos anos 90 do século passado e a direção da peça de Teatro do Absurdo "A Última Gravação De Krapp".  Sobre a primeira: foi uma instalação artística com performance que intitulei INTALAÇÃO: UMA BAD TRI PSICODÉLICA. Consistia esta obra, num trabalho onde utilizei um poliedro com um casal de artistas nus. Começava num corredor estreito onde o público recebia de uma bailarina canudinhos para ter acesso ao corredor estreito, quase um labirinto, pois este corredor era feito de várias curvas, nas paredes o público lia pequenas biografias sobre alguns expoentes da contra-cultura, como Jack Kerouac, Allen Ginsberg, Carlos Castañeda, Thimothy Leary etc. No final do corredor estava o enorme poliedro, com os dois artistas despidos que realizam uma dança ao som (ensurdecedor) de um registro de uma sessão de ácido do Thimothy Leary, onde Jimi Hendrix toca baixo, uma viagem total.  E também tinha umas luzes de estrobo, coloridas, que dava um clima bem louco nisso tudo. As pessoas saíam chapadas sem ter usado nada, apenas o poder sugestivo da sensorialidade da coisa toda.  Sobre "A Última Gravação de Krapp" foi um belo trabalho de Teatro que dirigi, com o Mayr Mendes fazendo o papel ensandecido do velho Krapp, neste clássico monólogo do dramaturgo Samuel Beckett. O velho Krapp, neste peça, relembra sua vida escutando os antigos registros que tinha gravado num velho gravador de rolo, suas alegria e frustrações, é um trabalho lindo mesmo, e ficamos em temporada com ele por dois meses no teatrinho do SESC.
O: Sabemos que há coisas boas no cenário manaura.  Mas porque ainda vemos uma arte tão amadora (na sua maioria) em música, arte cênica e literatura em Manaus?
 J.B: Não sei responder com precisão a este questionamento, mas posso falar do Teatro com segurança: quem tem acompanhado com certa frequência o Teatro feito em Manaus percebe claramente que ocorreu uma mudança significativa, existem agora grupos que se preocupam com todos os recursos cênicos e de pesquisa nesta pós-modernidade, ou como queiram alguns, o Teatro Pós-dramático. Posso citar dois trabalhos de 2010 que muito me impressionaram: "Flores D'América", dirigido por Daniel Mazzaro e "Coisas Para Depois Da Meia-Noite", texto e direção de Denni Sales. São obras impressionantes, de forte rigor estético e com uma técnica impecável. Creio que em todas as áreas temos esta diferença de nível de produção, com esmero, outras nem tanto.  Cabe ao público, também esta tarefa de garimpar o melhor, fazer sua necessária filtragem para assistir realmente obras que mereçam sua atenção, contribuindo para sua apreciação estética, artística e de divertimento.
O: Você já produziu arte no teatro, na música, na literatura e na fotografia.  Qual dessas é a linguagem mais difícil de produzir?  Qual a que você mais gosta de fazer?
 J.B: Sinceramente não tenho uma predileção, mas posso assegurar que no Teatro tenho mais segurança em meu processo criativo. Sobre a mais "difícil", creio que por minhas limitações a música me exige muito mais esforço de criação.
O: Vivemos num país que não tem a cultura da leitura (ainda mais na região Norte).  No seu ponto de vista, qual seria a solução pra esse problema tão sério na educação?
 J.B: Acabar de uma vez com o Ministério da Educação, criando o Ministério do Conhecimento.  Na visão anarquista que tenho, seria um outro mundo, um outro paradigma.  Creio que ninguém poderia ter um salário no Brasil superior a 5 mil reais.  O dinheiro é o grande mal deste mundo, por isso os políticos aumentam seus vencimentos tão rapidamente, quem ganha 10 mil não se contenta com 10 mil, quer sempre o dobro.  Isso é nefasto, insano. Não confio em ninguém que tem um salário superior a 5 mil, acho que a numerologia ou a cabala explicam esta minha fascinação pelo número 5.  Não fugi da pergunta não, pois na minha visão quem ganha mais de 5 mil reais não tem tempo para ler com profundidade nada, nenhum livro de valor, talvez leia Paulo Coelho, talvez.
 O: Você também é naturista.  Explique para o leitor o que é o naturismo.
 J.B: Naturismo é uma bela filosofia de vida, onde não interessa a nudez investigativa.  É ter o corpo nu(a) de quem quer que seja da forma mais simples e natural possível, buscando a integração desta nudez com a natureza.  Vocês lembram ainda como viviam os índios nesta terra?  Pois é, seria o retorno das tribos no quesito nudez natural, que simplesmente foi subtraída (ou podemos dizer traída) por valores outros, como o comércio do corpo, por exemplo. Nossa meta no naturismo amazônico é convencer o índio a voltar à nudez, junto com seus descendentes (os manauaras, os amazonenses).  Temos um grupo bastante atuante nesta área do naturismo amazônico, chama-se Graúna (Grupo Amazônico União Naturista), com 7 anos de atividades regulares no naturismo e na defesa do meio ambiente.  Em nosso site vocês podem conferir tudo isso.  http://www.graunaam.com.br
 O: Como é o seu trabalho no meio?
 J.B: Sou um dos fundadores do grupo, já passei pela presidência do grupo, já escrevi livros sobre o assunto, já estive em outros estados representando o grupo, enfim, muito trabalho no Naturismo.  Atualmente sou Diretor de Cultura e Divulgação do Graúna, e também vice-presidente da FBrN (Federação Brasileira de Naturismo), a entidade maior do naturismo organizado no Brasil, com longa tradição na defesa de nossos idéias, no nosso código de ética.  Lutamos por um mundo melhor, por um planeta melhor, mas que a nudez tenha vez, seja vista da forma que achamos correta na sociedade, sem traumas, falsos pudores, preconceitos, ou seja, uma nudez natural.
O: Devido ao nosso clima e nossa natureza abundante, temos um grande potencial para o naturismo, mas o movimento aqui ainda é muito pequeno.  O que falta pra que cresça?
 J.B: Falta compromisso, espírito de grupo, que aliás é um tema muito importante de ser tratado hoje em dia.  Verifico que esta crise de grupos não é só no Graúna, mas em TODOS os grupos sociais.  É muito difícil hoje em dia estabelecer prioridades, por diversos motivos, a concorrência, o mercado de trabalho, a busca desenfreada por um degrau a mais na escala social.  Imaginem vocês, nós naturistas somos a minoria da minoria, pensem bem nisso, e precisamos trabalhar em dobro para manter acesa a nossa luta naturista.  O que muitos consideram perda de tempo nós chamamos de prioridade.  Assim é e assim continuará sendo.  Não queremos somente pessoas nuas, tirar a roupa é só uma etapa, o prosseguir neste ideal é que são outros quinhentos.
O: Qual o seu próximo trabalho artístico?
 J.B: Montagem da peça PSICOSE 4:48 da dramaturga Sarah Kane, com atuação da atriz Guta Rodrigues, uma atriz excelente e de alta sensibilidade.  Realizamos uma leitura dramatizada da peça em novembro, com ótima aceitação do público, lá no Casarão de Idéias.  Inclusive um crítico de arte de Pernambuco, que também montou Sarah Kane, chamado Wellington Júnior, demonstrou todo interesse em apoiar a montagem do trabalho.  Fizemos até com música ao vivo, com baixo e harmonium indiano, foi um trabalho que gostei mesmo de ter realizado neste ano de 2010.  Um outro projeto, que inclusive já comecei, é a tradução da obra poética da argentina Alejandra Pizarnik, uma poeta brilhante, inexplicavelmente pouco lida ainda no Brasil.
O: Deixe seus contatos e suas palavras finais para nossos leitores.
 J.B: Você pode mandar seu e-mail para: vicaflag@hotmail.com , espero sinceramente que esta entrevista tenha sido esclarecedora sobre o Naturismo, pois creio que não podemos esquecer os benefícios da nudez social em nossa região, que tem elos inquestionáveis com esta nudez "perdida".  Aos seguidores do blog do Orestes deixo um abraço e que continuem acessando e divulgando este blog.  Realmente um blog diferente dos demais, ou da grande maioria, com textos atuais, diversificados, e feitos, sim, por um artista, por mais que o Orestes não queira ser chamado assim, mas que eu faço questão de chamar.  Pois como o Orestes mesmo diz: a autoridade é feita para ser contrariada.  hehehe.  Um abraço!

Um comentário:

  1. Eis aí, JB mandando ver, como sempre, sua arte e sua luta por ela, num embate desigual contra a mediocridade globalizante, "vestida" de tecnologias que criam ilhas ao invés de pontes.

    E, nestes tempos em que o fantasma do dirigismo cultural ameaça dar as cartas; e Monteiro Lobato quase foi enquadrado, um Ministério do Conhecimento é tudo que certa elite nem ousaria cogitar.

    Escrevi besteira, mas deixo aqui o meu recado.

    PS: Ainda não ganho R$ 5 mil. Estou fora da zona de perigo. :D

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