Auto biografia artística virtual. Registros de eventos, resenhas, desenhos, crônicas, contos, poesia marginal e histórias vividas. Tudo autoral. Quando não, os créditos serão dados.

Qualquer semelhança com a realidade é verdade mesmo.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Susto Premeditado


A noite estava fria e caia uma garoa constante que embalada pela forte brisa das serras paulistas fazia tremer os mais calorosos dos corpos.  Para os demais nem estava tão frio assim, mas para um bom amazonense, eu me encontrava mais empacotado do que bagulho em mala de traficante no aeroporto.
Não tínhamos atividade para aquela noite de Treinamento de Ação do Greenpeace realizado no Clube da Aventura em Nazaré Paulista, mais detalhes sobre o local paradisíaco podem ser conferidos no site www.clubedaaventura.com.br.  Até então já havíamos tido orientação em forma de seminários sobre ação, scouting, questões legais dentre outros assuntos.  Também tivemos simulação de ação, onde todos do grupo participaram com a veemência de quem está engajado numa causa filosófica ambiental.
Agnaldo era o único que estava na parte externa da casa, arrumando algo em sua barraca que era a mais afastada dentre todas as armadas no extenso terreno.  Como manauara até que ele estava suportando bem o clima da noite.
Todos reunidos no pátio coberto, enquanto esperavam a primeira pizza sair do forno, jogavam conversa fora trocando as experiências pessoais de quem veio de Porto Alegre, Brasília, Manaus, Belém, São Paulo e Rio de Janeiro.
Vez ou outra eu me aproximava do forno e me aquecia próximo às chamas do fogo que naqueles momentos me proporcionavam um calor tão agradável quanto as coxas de uma ex-namorada perpetuada em minha memória.
Tudo acontecia na mais tranquila da rotina campestre.  Eu apreciava a garoa que se intensificara um pouco tornando-se um fino chuvisco quando Karen (acho que ela é de São Paulo) disse:
-         Pessoal!  Tem alguém brigando com o Agnaldo!
Meu sub-consciente:
- Vai lá Mário!  Tu podes pegar uma pneumonia, mas o importante é ajudar o Agnaldo!
Meu raciocínio lógico:
-         Brigando?  Estranho!  Nunca vi o Agnaldo metido em confusão!
Karen inssistiu:
-         Pessoal!  Vai alguém lá ajudar o Agnaldo!
Meu sub-consciente:
-         Corre Mário!
Meu raciocínio lógico:
-         Merda!  Lá vou eu pegar pneumonia!
Não hesitei mais e me meti embaixo de chuva correndo na direção da área onde estavam armadas as barracas!  Passei pela borda da piscina diminuindo um pouco o ritmo com o intuito de não escorregar na ocasião tornando a noite mais desgraçada do que começava a prometer.
Antes de lá chegar, avistei dois estranhos com Agnaldo.  Estavam com chapéus, capas-de-chuva e o que mais assustava, ambos estavam empunhando cacetetes enormes.  Para amenizar a possível treta, já cheguei falando em alto tom de voz:
-         O que está acontecendo?
-         Cês tão perturbando agente! – disse um dos estranhos.
Meu raciocínio lógico:
-      Eles empunham cacetetes, mas as mãos livres deles procuram algo na cintura.  Eles estão com armas de fogo!
-         Quem perturbou vocês? – pergunto.
-         Vocês! – disse o outro estranho.
Os demais colegas começaram a chegar amontoando-se por trás de mim.
Meu raciocínio lógico:
-      As mãos continuam apalpando a cintura por dentro das capas-de-chuva, mas onde estão as armas de fogo?
Meu sub-consciente:
-         Tem alguma coisa errada!
O chuvisco começava a molhar-me toda a roupa, mas eu estava preparado para continuar ali defendendo Agnaldo e os demais se necessário fosse.
Um dos estranhos retrucou:
-      Agente acorda cedo e não consegue trabalhar direito porque cês ficam fazendo maior bagunça aqui!
-      Cês não são nem daqui, ficam fazendo maior barulho! – disse o outro estranho.
Meu raciocínio lógico:
-         Eles não estão embriagados e Agnaldo está passivo demais!
Meu sub-consciente:
-         As mãos não encontram nada na cintura!  É um blefe!
Um deles insistiu em dizer:
-         Não dá nem pra trabalhar direito que cês ficam perturbando agente!
Eu perguntei tentando ganhar tempo:
-         Mas quem perturbou vocês?
Meu raciocínio lógico:
-      Está tudo muito estranho!  Eles estão vestidos com roupas iguais!  Diogo, Letícia e Pablo que são os organizadores do treinamento sumiram!  Guilherme que é o dono do Clube da Aventura também sumiu!  Agnaldo que é um cara ativo está contemplativo demais!  É uma farsa!
Meu sub-consciente:
-         Sai da chuva, Mário!
Alguém do grupo falou algo para os estranhos que não percebi, pois eu já havia dado meia volta, tomando a direção da casa em passo rápido, visto que agora meu objetivo não era mais prestar ajuda ao Agnaldo, e sim evitar uma pneumonia me protegendo do chuvisco.
Assim que voltei para o abrigo, comuniquei imediatamente para Adriana (esposa de Guilherme):
-         Seria bom avisar ao Guilherme sobre a bronca que está tendo!
-         Já avisei! – disse ela apontando com a cabeça na direção do banheiro.
Meu sub-consciente:
-      Além dos organizadores estarem sumidos, o Guilherme está no banheiro há muito tempo!
De repente o grupo estava voltando para a casa acompanhado dos dois estranhos e todos riam com a mesma euforia de quem acaba de receber uma boa surpresa.
Meu sub-consciente:
-      Eu sabia que era uma armação!  A treta estava muito artificial para ser verídica!
Logo em seguida apareceram sorridentes Letícia, Pablo, Guilherme e Diogo que quando questionado por alguém sobre qual a intenção do susto premeditado, explicou categoricamente:
-      A intenção era criar uma simulação onde vocês não soubessem que a situação não era verdadeira!
Ele foi feliz nisso.  Uma vez colocados numa situação onde pensávamos que realmente estaria acontecendo, poderíamos agir da maneira mais natural possível, desta feita, estaríamos sujeitos a análise de nossas reações mais espontâneas em uma ação realizada pelo grupo.
O Treinamento em si foi muito bem organizado.  Não houve indícios de falhas.  O cronograma foi cumprido em tempo hábil e tanto a parte teórica como a prática, atendeu as necessidades dos participantes quanto a capacitação e satisfação, visto que foram dias inesquecíveis, mesmo com os sustos premeditados.


                    Por: Mário Orestes Silva.

Um comentário:

  1. Já ouvi essa estória de várias pessoas. Mas, nenhuma delas narrou com tanta riqueza, adorei!!
    Abraços

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