Auto biografia artística virtual. Registros de eventos, resenhas, desenhos, crônicas, contos, poesia marginal e histórias vividas. Tudo autoral. Quando não, os créditos serão dados.

Qualquer semelhança com a realidade é verdade mesmo.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Jorge Cabeleira e o Dia Em Que Seremos Todos Inúteis

A resenha a seguir eu fiz para o blog do programa Vertical Classic Rock.  Na verdade trata-se de um disco que penso ser maravilhoso e em breve eu postarei mais resenhas nesse blog de outras bandas, discos, filmes, livros ou outras coisas que admiro.


 Quando lemos uma resenha de disco, sabemos tratar-se de um álbum conhecido clássico ou de um lançamento que certamente não demorará pra estar rodando de mão em mão entre os amigos.  Porém quando se trata de um disco desconhecido, de uma banda menos conhecida ainda, o prato pode ser indigesto pra maioria acostumada a receber tudo já divulgado pela indústria fonográfica.  Contudo, meus amigos, se vocês forem mais perspicazes no tocante a procura, nem precisa ser uma pesquisa profunda, pode-se conhecer sons surpreendentes que levantam facilmente o questionamento do porque aquele tal disco não ter estourado na mídia.
Cenário: rock nacional do nordeste brasileiro.
Época: década de 90.
A estagnação criativa imperava na releitura de tudo o que já havia sido feito.  Nos E.U.A. surge o grunge que remodelou o punk e surgiu com moda (alguns dizem tendência) no vestuário, na sonoridade e na atitude de centenas de bandas.  No Brasil, algo pra salvar a década: um ímpeto underground artístico que ficou conhecido como mangue beat.  Dentre tantas bandas que estamparam sucessos em rádios e na MTV, algumas ficaram no ostracismo, apesar de serem excelentes.  Uma dessas é a desta resenha.  “Jorge Cabeleira e o Dia Em Que Seremos Todos Inúteis”.  Sim, o nome desta banda de Recife é este mesmo.  E o disco abordado é o homônimo à banda, primeiro álbum lançado pela Sony Music em 1994.
12 Badaladas” abre o trabalho apresentando logo de início influências de histórias em quadrinhos, desenhos animados, filmes trash, hard core e música nordestina.  “Jabatá E O Diabo” narra uma história de terror em pleno sertão selvagem.  “...ladrão praga, enchente e um bando de gente doente” abundam com o sorriso do diabo enquanto Jabatá diz “Quero toda safada enrolada num pano preto melado de sangue e cera de vela queimada”.  “Sol e Chuva” é uma versão da música de Alceu Valença que aqui ganha uma roupagem contemporânea e certamente satisfazendo o autor.  “Carolina” mostra como até Luiz Gonzaga pode virar uma versão de muito bom gosto alternando partes de forró de pé de serra com hard core que cativam para o pogo.  “Nervoso Na Beira Do Mar” é poética.  Começa com uma batida preguiçosa de guitarra elétrica, transformando-se num punk rock de primeira.  “Silepse” mantém o ritmo de punk rock misturado com baião com letra regional e retratando a realidade sertanista. “A História Do Zé Pedrinho” conta uma tragédia nordestina de traição conjugal de uma maneira tão simplista que chega a ser envolvente em sua narrativa. A poesia de “O Dia Em Que Conceição Subiu A Serra” mostra como levar o ritmo nordestino com guitarras de uma maneira bem peculiar.  “Canudos” é uma tragédia megalomaníaca em que remete o ouvinte a um dos episódios mais sangrentos da História do Brasil onde o Estado reprimiu e chacinou um povo que só queria viver em uma comunidade independente.  “Os Segredos De Sumé” é outra versão, agora de Zé Ramalho e conta com a participação especial do próprio que atesta a boa miscelânea musical provocada.  “Recife” é uma espécie de desabafo que prega a reforma agrária, a descriminalização da maconha e reclama das condições precárias do homem do sertão e do favelado da capital.  “Psicobaião” poderia muito bem ter sido composta por um dos grandes nomes da música nordestina, já citados aqui.  “Carnaval” fecha o disco com um dos hard core mais raivosos já registrados pela indústria fonográfica.  É a única música do álbum que não tem influências nordestinas e exatamente como um carnaval, passa o clima de desordem.
Em suma, instrumentos de arranjos como guitarras distorcidas, triângulo e sanfona, em parceria com o sotaque carregado e desleixado, equilibram a raiva do recifense urbano e do agricultor abandonado no sertão.  Dificilmente surgirá uma outra banda que conseguiu essa coerência perfeita entre baião, punk rock, forró e hard core.  Pena o grupo não existir mais.  Porém o legado está registrado comprovando que o criativo, o empolgante e o poético nem sempre estão disposto de uma maneira mais aberta para o público em geral.

4 comentários:

  1. Mário o Jorge Cabeleira voltou com força total saca a matéria que saiu no Jornal do Commercio de Recife.

    Que tal fazer uma resenha nova?

    http://jconlinedigital.ne10.uol.com.br/restrito/edicoes/2012/8/26/1/caderno%20c/0826_05_CDC_01/0826_05_CDC_01.jpg

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Fico muito feliz com a volta da banda. Espero mesmo que seja duradoura.
      Abraços.

      Excluir
  2. Parece que estão lançando um disco ao vivo comemorando os 20 anos da banda. Ass.: Virgílio Simões

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Virgílio,

      Parece que o primeiro comentário acima, é de alguém ligado a banda.
      Então eles estão ativos sim.
      Longa vida ao Jorge Cabeleira.

      Excluir